Museu Magüta Renasce com Novo Estatuto Aprovado pelas Lideranças Ticuna: Um Marco Histórico para a Cultura Viva do Alto Solimões


Foto: Magüta Native

Entre os dias 16 e 18 de fevereiro de 2023, o povo Ticuna viveu um momento de grande importância: a realização do Encontro Geral para a reformulação do Estatuto do Museu Magüta, uma das maiores referências culturais indígenas do Brasil e do mundo. O evento reuniu mais de 15 organizações de base, entre elas FOCCIT, CGTT, OGPTB, Instituto Ngutapa, AMATÜ, Associação Magüta e outras, representando os sete municípios que compõem o território do Alto Solimões. Com a presença de lideranças, estudantes e mulheres indígenas, o Museu reafirma seu compromisso com a memória viva e a continuidade da luta por autonomia.

Desde sua fundação, o Museu Magüta é símbolo da resistência e da identidade do povo Ticuna. Com reconhecimento nacional e internacional, o museu guarda não apenas objetos, mas também histórias, cantos, saberes e lutas. No entanto, diante das atualizações das legislações e do novo Código Civil, tornou-se necessário revisar e fortalecer o seu Estatuto para que a instituição caminhe com mais segurança, estrutura e legitimidade. Esse processo foi feito a muitas mãos, com diálogo horizontal e escuta das bases.

Foto: Magüta Native

Durante os três dias de encontro, o antigo estatuto foi analisado detalhadamente. Surgiram propostas de inclusão de novos artigos, parágrafos e capítulos que contemplassem as divisões internas do museu, como os departamentos de Documentação e Pesquisa, Preservação do Acervo Museológico, Arqueologia, Antropologia e outras áreas. As discussões também apontaram para a inclusão de novos membros no conselho gestor, representando as diversas organizações Ticuna da região. A proposta foi recebida com entusiasmo e envolvimento coletivo.

No encerramento do encontro, realizado no dia 18 de fevereiro, o novo texto do estatuto foi lido, debatido e aprovado em plenária com a presença dos representantes das organizações indígenas. Professores, lideranças, jovens e mulheres deram suas contribuições, destacando a importância de se construir um museu com base na autonomia dos povos indígenas, com diretrizes que valorizem a ciência indígena, a ancestralidade e a governança comunitária. O consenso foi construído em harmonia, refletindo o espírito coletivo do povo Magüta.

Foto: Magüta Native

A revisão final do documento contou com o apoio técnico de professores da UFAM, do advogado especializado em direitos indígenas e do antropólogo João Pacheco, que há décadas colabora com o povo Ticuna. A participação técnica aliada ao saber tradicional fortaleceu o documento final. O novo estatuto não apenas atualiza normas, mas também reafirma a visão de que o museu é instrumento político, pedagógico e espiritual para o fortalecimento da cultura Ticuna.

Os participantes do encontro destacaram figuras históricas como o falecido Nino Fernandes, liderança fundamental na construção do Museu Magüta, como símbolo da resistência que não se apaga. A nova fase do museu, sob a atual direção de Santos Cruz, é vista como um renascimento. Com o novo estatuto, os papéis do conselho e da diretoria foram reconfigurados para garantir mais participação, mais fiscalização e, principalmente, mais poder de decisão aos povos indígenas.

O Museu Magüta deixa de ser apenas uma estrutura física e se reafirma como território simbólico de luta, memória e educação. Os jovens Ticuna, presentes no encontro, emocionaram-se ao saber que agora terão mais voz nos espaços culturais e de gestão. As mulheres indígenas também reivindicaram participação nos departamentos e estão sendo contempladas com novos espaços dentro da estrutura organizacional, promovendo equidade e protagonismo.

Para além de uma simples reformulação jurídica, o novo estatuto é também um documento político de afirmação de existência. Ele resgata a dignidade, reconhece os direitos e define o museu como um órgão coletivo de preservação e criação cultural. A partir de agora, toda e qualquer ação do museu será regida por este novo documento, que nasceu da coletividade e das aspirações legítimas dos Magüta.

Foto: Magüta Native

As lideranças deixaram claro que, com o novo estatuto, o respeito à autonomia indígena na gestão cultural deve ser respeitado por todas as instituições públicas e privadas que desejam dialogar ou estabelecer parcerias com o Museu Magüta. O tempo da imposição acabou. Agora é o tempo da escuta, da cooperação e da afirmação do poder dos povos indígenas sobre seus próprios espaços culturais.

O novo estatuto marca o início de uma nova era para o Museu Magüta: mais democrático, mais técnico, mais espiritual e profundamente enraizado nos valores e saberes Ticuna. Como afirmaram os participantes na plenária final: “Não basta guardar objetos, é preciso manter viva a alma do nosso povo. E o Museu Magüta é essa alma coletiva que não morre.”


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