A forças dos povos indígenas, a vozes dos territórios: I Fórum Internacional Indígenas pela vida e pela


Foto: @magutanative

Entre os dias 23 e 26 de junho de 2025, na quadra poliesportiva do Exército Brasileiro, em Tabatinga-AM, território localizado na Tríplice Fronteira entre Brasil, Peru e Colômbia, está sendo realizado o 1º Fórum Internacional Indígena: Segurança Pública, Justiça Social e Acordos de Paz em Contexto de Fronteira. O evento ainda está em andamento e segue mobilizando lideranças, organizações e autoridades indígenas e não indígenas para debates fundamentais sobre os desafios enfrentados pelos povos originários em regiões fronteiriças. O evento foi uma construção coletiva da Organização Federal das Organizações, Caciques e Comunidades Indígenas da Tribo Ticuna (FOCCIT), da Associação de Mulheres Indígenas de Belém do Solimões (MAPANA) e do Projeto AgroVida, em parceria com os povos Kokama, Witoto, Kanamari, Kaixana, Kambeba, Marubo, Mayuruna, Matses, Jahua e outras etnias, e contou com o apoio da FUNAI, da Amazon Conservation Team (ACT Brasil e Colombia) e do Fundo Casa Socioambiental. Este encontro foi motivado pela necessidade urgente de discutir e buscar soluções para a grave situação de insegurança, abandono estatal e violações de direitos que afetam os povos indígenas da região.

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O Fórum reuniu cerca de 500 participantes indígenas, incluindo povos Ticuna, Kokama, Kambeba, Witoto, Marubo, Kanamari, Mayuruna, Matses e outros. Estavam presentes representantes indígenas das regiões do Médio e Alto Solimões, bem como do Vale do Javari, além de delegações indígenas do Peru e da Colômbia, como Ticuna, Kokama, Jahua e outros povos originários dessas áreas. Assim, o evento contou com a participação de povos do Médio Solimões, Alto Rio Solimões, Vale do Javari, além de representantes de territórios indígenas peruanos e colombianos.As fronteiras geopolíticas dos Estados não separam as lutas, os saberes e os vínculos ancestrais desses povos, que compartilham uma história comum marcada pela resistência, pelo cuidado com a floresta, pelos rios e pela defesa dos territórios. O encontro foi um marco histórico para reafirmar que, embora os Estados imponham fronteiras, os povos indígenas mantêm vivas suas conexões culturais e espirituais.

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No segundo dia do encontro, o clima ficou mais tenso. As lideranças indígenas aproveitaram esse momento para aprofundar os debates, enquanto autoridades governamentais realizavam visitas às comunidades de Belém do Solimões, Ourique e Feijoal, com o objetivo de conhecer de perto a realidade vivida pelas populações locais. Durante as apresentações dos equipes que ficaram no local do evento, apresentaram os debates e perguntas foram feitos de forma direta e contundente, em resposta às exposições realizadas por diversas organizações. Cada liderança compartilhou suas experiências e apontou os inúmeros problemas enfrentados nos territórios, destacando as formas distintas com que lidam com suas situações. Foram apresentadas experiências de trabalho de indígenas da União dos Indígenas do Vale do Javari (UNIVAJA), bem como de lideranças indígenas do Peru e da Colômbia, que trouxeram exemplos de modelos de governança voltados à proteção e gestão territorial.

Também se destacou a fala do representante do Conselho Indígena de Roraima (CIR), que compartilhou a experiência de unificação das guardas, segurança e vigilância indígenas em seu território, através de políticas de fortalecimento das malocas e da organização comunitária. Essas trocas evidenciaram a riqueza das estratégias locais de resistência e apontaram caminhos concretos para a construção de políticas públicas eficazes a partir das realidades e protagonismo dos povos indígenas.

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Apesar do cenário de violência e descaso, as comunidades indígenas reafirmaram sua esperança como uma prática de resistência. O Fórum fortaleceu o sonho coletivo de construir protocolos próprios de segurança, acordos de paz e justiça social, baseados nas cosmovisões e nos modos de organização dos povos indígenas. A sabedoria dos anciãos lembra que a paz, para os povos originários, não é apenas ausência de guerra, mas um estado de equilíbrio com a natureza, de respeito aos espíritos, aos rios, às florestas e à vida em todas as suas formas.

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 Ao longo do evento, deverão ser apresentadas denúncias às autoridades presentes. A realidade vivida nas comunidades da tríplice fronteira é marcada pelo avanço do narcotráfico, tráfico de armas, exploração de mulheres e crianças, crescimento do alcoolismo, das drogas e dos suicídios entre os jovens, além das invasões constantes de garimpeiros, madeireiros, caçadores e pescadores ilegais. Some-se a isso a falta de bases permanentes de fiscalização nos rios e nas terras, o que deixa as populações indígenas expostas às ações criminosas e à omissão do Estado. As comunidades se expandem, se tornam grandes, algumas com mais de 8 mil habitantes, mas seguem sem acesso digno à segurança, saúde, educação e infraestrutura adequada e muitos outros assuntos deverão ser levantados e encaminhados durante a discussão dos Grupos de Trabalho (GTs), que será realizada no dia 25.

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Diante desse cenário, o Fórum deverá construir propostas concretas para enfrentar essa realidade. Entre elas, destacou-se neste segundo dia a possibilidade de criação de uma Força Comunitária de Proteção Territorial Indígena, que poderá ser consolidada durante as discussões e apresentações dos Grupos de Trabalho (GTs) nos próximos dias. A proposta se inspira em experiências de vigilância autônoma, como o GP20 de Roraima, conduzido pelos próprios indígenas. Além disso, deverá ser exigida a implantação imediata de bases permanentes de fiscalização nos rios e terras indígenas, bem como a construção e o reconhecimento legal de protocolos próprios de segurança e consulta. Também será defendida a implementação urgente de programas voltados à saúde mental, à proteção das mulheres indígenas, ao combate ao tráfico de drogas e à prevenção do suicídio nas comunidades. Todas essas medidas têm como intenção serem concretizadas por meio da pactuação entre as lideranças indígenas de todas as regiões, reafirmando o protagonismo dos povos na defesa de seus territórios e modos de vida..

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O protagonismo das mulheres indígenas foi central em todo o processo. Foram elas que puxaram a construção do Fórum, denunciaram as múltiplas violências, defenderam os territórios e conduziram os diálogos sobre segurança, justiça e paz. As mulheres enfatizaram que “não há segurança se nossas vidas não são protegidas” e que o fortalecimento dos territórios passa necessariamente pela valorização dos saberes, da liderança e do papel das mulheres na gestão comunitária, na transmissão da cultura e na construção de soluções sustentáveis para os povos e mesmo com um clima tenso diante das autoridades indigenas presentes, o Fórum reafirmou a esperança e a força dos povos originários, que exigem protocolos próprios de segurança, políticas públicas efetivas e o respeito à autodeterminação. As mulheres indígenas foram protagonistas na construção das propostas para garantir proteção, justiça e paz verdadeira..

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Como o Fórum ainda está em fase de discussão, pode ser reafirmado que os povos indígenas da tríplice fronteira não aceitarão mais viver sob o silêncio, a omissão e a negligência dos Estados. As vozes que se levantaram em Tabatinga ecoam como um chamado mundial: “Territórios livres, povos vivos. A segurança da floresta, dos rios e das nossas vidas é a segurança da humanidade. Não há paz possível sem justiça, sem respeito e sem os povos indígenas no centro das decisões que nos afetam.” Este Fórum não representa um ponto final, mas sim o início de uma mobilização permanente em defesa da vida, dos territórios e das futuras gerações. A construção coletiva de propostas e denúncias mostra que os povos indígenas seguem firmes na luta por justiça e autonomia, exigindo que suas vozes sejam ouvidas e respeitadas nos espaços de decisão

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