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Foto: Divulgação/Comissão I Fórum |
Brasília recebeu, nos dias 05 e 07 de agosto de 2025, duas reuniões de forte impacto político e social para os povos do Alto Solimões. No dia 05, a presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joenia Wapichana, ouviu lideranças femininas da região, acompanhadas de representantes do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) e Polícia Federal. Já no dia 08, o diálogo se estendeu ao Palácio da República, com o Diretor Executivo da Presidência da República, Sr. Jarbas, e Juarez, para a entrega da Carta Oficial do I Fórum Internacional Indígena de Segurança Pública, Justiça Social e Acordos de Paz em Contexto de Fronteira.
“Não viemos pedir favor, viemos exigir direitos”, foi a frase que abriu o encontro. As mulheres do Alto Solimões chegaram a Brasília carregando não apenas documentos, mas também a dor acumulada de décadas de abandono estatal. Elas afirmam que a insegurança não é uma ameaça distante, mas um cotidiano marcado por mortes, ameaças, invasões e medo. “Viver na fronteira é acordar sem saber se todos voltarão para casa ao fim do dia”, disse uma das representantes.
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Foto: Divulgação/Comissão I Fórum |
A reunião foi convocada pela comissão organizadora do I Fórum Internacional Indígena de Segurança Pública, Justiça Social e Acordos de Paz em Contexto de Fronteira, realizado em junho deste ano em Tabatinga. Na ocasião, mais de 600 participantes entre caciques, anciãos, juventude e organizações indígenas debateram a crescente violência, o aumento de suicídios, o consumo de álcool e drogas, além da presença de atividades ilegais em territórios indígenas. A carta levada a Brasília é fruto direto dessas discussões e representa um pacto coletivo pela defesa da vida e dos territórios.
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Foto: Divulgação/Comissão I Fórum |
A carta entregue não é um apelo isolado. Ela condensa anos de denúncias ignoradas, protocolos não cumpridos e promessas interrompidas. Representa também a união inédita de diferentes povos, que, apesar de línguas e tradições distintas, reconhecem que a luta pela terra e pela segurança é indivisível. “Quando uma aldeia é atacada, todas nós sentimos. Somos uma só voz, mesmo que venhamos de rios diferentes”, declarou Edilene Kaixana.
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A comissão presente foi formada por mulheres que representam a força e a resistência de seus povos: Eraldina Ticuna (FOCCIT), Edilene Kaixana (OPIKT), Josiane Ticuna (Projeto AgroVida), Luciana Ticuna (Makiraeta/Umiab), Eliana Kambeba e Evanilde Kambeba (OKAS), Márcia Kokama, Glades Kokama, Claudia Kokama, Claudete Kokama e Tatiana Kokama (AMIKAM). Todas levaram, em uníssono, denúncias e relatos de urgência um verdadeiro “grito de socorro” sobre a violência, insegurança e abandono que atingem as comunidades fronteiriças.
As lideranças ressaltaram que sua presença na capital federal simboliza a união de diferentes povos do Alto Solimões, como Ticuna, Kokama, Kaixana e Kambeba, que há décadas resistem a pressões econômicas e políticas sobre suas terras. Elas lembraram que, mesmo vindas de localidades distantes e com dificuldades logísticas, a mobilização foi necessária para “romper o silêncio e mostrar que nossas vozes têm força para atravessar rios e fronteiras”.
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Foto: Divulgação/Comissão I Fórum |
As lideranças narraram que, sem presença efetiva do Estado, a fronteira se transformou em corredor livre para facções criminosas, traficantes e invasores ambientais. A declaração revela a gravidade da situação enfrentada pelas comunidades, mostrando que o crime não é algo externo ou distante, mas sim uma presença constante e ameaçadora dentro dos próprios territórios. Quando se diz que o crime “mora dentro” das comunidades, isso indica que criminosos armados estão infiltrados, controlando e vigiando as pessoas, gerando medo e insegurança. Essa realidade transforma o cotidiano dos moradores, que vivem sob constante ameaça, dificultando a tranquilidade e a liberdade dentro de seus próprios espaços. É uma denúncia forte sobre a falta de proteção e o avanço da violência diretamente onde essas comunidades vivem. Elas relatam que crianças e jovens têm sido recrutados por grupos ilegais, enquanto o consumo de drogas e álcool cresce sem controle, gerando um colapso social silencioso.
A pauta das reuniões foi marcada por reivindicações concretas:
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Entrega da Carta Oficial do Fórum Internacional Indígena, documento que reúne denúncias e propostas construídas coletivamente.
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Criação de uma Comissão Interinstitucional entre órgãos indigenistas, saúde, segurança pública e meio ambiente, além das Forças Armadas e lideranças indígenas, para coordenar ações de segurança na fronteira e territórios indígenas.
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Reconhecimento e apoio aos Guardas Indígenas, responsáveis pela proteção comunitária.
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Implementação dos Planos de Gestão Territorial no Alto Solimões.
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Criação de protocolos de comunicação segura para denúncias, protegendo informantes.
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Força-tarefa urgente para combater a violência nas comunidades de Belém do Solimões, Feijoal e Umariaçu.
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Demarcação das Terras Indígenas do Alto Solimões, conforme garantido pela Constituição.
“Não estamos pedindo luxo, estamos pedindo sobrevivência”, reforçou, ao defender a criação urgente de uma força-tarefa e a instalação de bases de segurança. Para elas, cada item da pauta significa salvar vidas, impedir mortes e garantir que tradições ancestrais continuem existindo. Sem a demarcação das terras, dizem, não há onde plantar, pescar, nem criar filhos com dignidade.
As pautas apresentadas não são apenas demandas pontuais, mas sim medidas de sobrevivência diante de um cenário de risco permanente. A reativação da Base Anzol e a criação de protocolos de comunicação segura foram destacadas como urgentes, já que lideranças têm sofrido ameaças constantes e, muitas vezes, não encontram meios seguros para denunciar crimes. A demarcação de terras foi citada como “a base de todo o resto”, pois sem território protegido não há segurança, saúde ou futuro para as novas gerações.
Como encaminhamento, ficou acordado que será estudada a criação de um comitê ou comissão permanente para segurança e proteção territorial no Alto Solimões, garantindo que as demandas não fiquem restritas ao papel, mas avancem em ações concretas e contínuas.
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Foto: Divulgação/Comissão I Fórum |
As mulheres foram diretas ao exigir que os ministérios e órgãos presentes assumam compromissos por escrito e apresentem prazos. As mulheres expressas os sentimentos de frustração e indignação de sua comunidade diante da falta de ações efetivas por parte das autoridades. Ele destaca que as pessoas não querem mais apenas ouvir promessas que não se concretizam, mas sim ver resultados concretos que realmente melhorem a situação vivida. Quando ele menciona a polícia, reforça o desejo de que a segurança pública seja garantida para proteger as comunidades, e não para intimidá-las ou ameaçá-las. Além disso, ao citar o Ibama e a Funai, órgãos responsáveis pela proteção ambiental e pelos direitos indígenas, ele cobra a presença efetiva dessas instituições nas áreas de atuação, atuando no campo e não apenas em documentos ou burocracia. O grupo afirmou que voltará a Brasília se as medidas não forem implementadas de forma imediata.
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Foto: Divulgação/Comissão I Fórum |
As mulheres também marcaram presença na IV Marcha das Mulheres Indígenas, realizada nesta semana em Brasília, da qual todas já fazem parte como integrantes ativas do movimento, reforçam que a luta por paz, justiça e proteção territorial é uma pauta urgente, viva e inadiável.. “Levaremos nossas denúncias às ruas, porque cada passo nosso é também um passo das mulheres que ficaram na comunidade cuidando de nossas famílias e territórios”, disse Josi Ticuna. A articulação nacional busca dar visibilidade a problemas que, embora locais, refletem um padrão de violências e negligências enfrentadas por povos indígenas em todo o país.
No encerramento, as lideranças se uniram num canto tradicional, reafirmando que a luta é coletiva e transfronteiriça. “Enquanto houver alcoslismo, crianças bebendo e viciados nas drogas, e a violencia cresce, nenhuma de nós estará em paz”, disse Josiane Ticuna. O gesto simbolizou a mensagem central levada ao coração político do Brasil: segurança, dignidade e paz não são favores são direitos que não podem mais esperar.
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